domingo, 11 de setembro de 2011

Divisão do Pará: Por um Novo Pacto Político Estadual.

*Edir Veiga-

Os principais argumentos apresentados pelos defensores da divisão territorial do Pará resumem-se a três linhas argumentativas: 1- O governo do Pará historicamente só investiu na região metropolitana, inexiste estado nos municípios em forma de aparatos de : segurança, saúde, saneamento, assistência social e investimento em infraestrutura para o crescimento econômico destas regiões, 2- O estado é de dimensão continental e portanto torna-se mais difícil governar e se movimentar internamente e, 3- O Pará só dispõe de hum bilhão/ano para investimento em todas as regiões do estado, o que seria absolutamente insuficiente para fazer frente às demandas destas. Portanto, a solução é a divisão do Pará, sendo um novo desenho geográfico e administrativo o remédio para suprir estas dificuldades estruturais.


Ora, o argumento apresentado pelos emancipacionistas também serve para 11 das as 12 regiões administrativas do Pará: Guamá, Caetés, Capim, Lago de Tucuruí, Xingu, Carajás, Araguaia, Baixo Amazonas, Tapajós, Tocantins e Marajó. Só a região Metropolitana está mais bem servida com equipamentos públicos em relação às demais regiões paraense. Mas ninguém ousaria propor a criação de mais onze unidades federativas no Pará.


O tamanho do território é apresentado insistentemente como justificativa para dividir o estado, afinal remover alguém para acessar equipamentos públicos na capital é tarefa hercúlea. Frente a este argumento posso afirmar que não há nada que um bom desenho institucional e administrativo baseado na descentralização dos serviços e da administração pública não venha a enfrentar. A questão é: O governo, o Legislativo e a sociedade civil paraense se disporiam a refazer o pacto político interno para enfrentar esta problemática de forma definitiva?


Podemos afirmar peremptoriamente que os defensores da divisão do Pará enxergam no fracionamento do território o atalho para fazer frente às dificuldades dos munícipes situados fora da região metropolitana. Num contexto de revolução na informação, nas comunicações e de governo eletrônico, estas dificuldades seriam facilmente equacionadas se as elites políticas, econômicas e a sociedade civil organizada se dispusessem a fazer este diálogo estratégico.


O Brasil é o que é, em relação à América Espanhola, não porque se fragmentou, mas porque se manteve unido e hoje ostenta uma riqueza multidimensional presente com potencial futuro ainda inexplorado de riquezas das mais diversas ordens. São Paulo e Minas enriqueceram e mantém-se entre os estados mais abastados da federação, não porque se fragmentaram, mais porquê se mantém unidos e lutando contra os movimentos emancipacionistas das elites interioranas do sudeste.


Outra linha argumentativa bastante convincente dos emancipacionistas é o valor em real/ano de que o governo do Pará dispõe para investimento, qual seja: hum bilhão de reais. Afirmam taxativamente: Caso surjam os dois novos estados (Carajás e Tapajós) só do Fundo de Participação dos Estados, cada hum receberia hum bilhão/ano, sem falar dos royaltes minerais e elétrico, do ICMS e do ISS.

Fica claro que a estratégia dos emancipacionistas não é focada em um projeto sistêmico e articulado de sociedade, mas baseia-se em argumentos paroquiais para conquistar mais orçamento para suas regiões e, de quebra, ganham mais dois governo do estado e todo seu aparato judiciário, administrativo, legislativo e político, ampliando o poder político do norte com mais dois governadores, seis senadores, 16 deputados federais e 48 deputados estaduais.


Sem dúvida este argumento apaixona as regiões conflagradas porque é paroquialista e como tal, aglutina a parte contra o todo provocando secessão. Ao mesmo tempo em que junta o particular, o discurso paroquial perde capacidade argumentativa com o todo, porque é desprovido de argumentos sistêmicos, de visão nacional e estadual, portanto, sem capacidade de hegemonizar os corações e mentes da maioria da sociedade nacional e estadual.


Caso os defensores da segmentação do Pará centralizem seus argumentos nos aspecto orçamentários e de representação política na federação, da maneira como vêm fazendo, estes vão despertar, antecipadamente, o veto político do sul e do sudeste ao seu intento, que não quererão realizar uma reforma tributária e um rearranjo do pacto federativo, em favor do norte, travestido de um discurso separatista. Creio que o caminho mais curto para enfrentar as dificuldades enumeradas pelos emancipacionistas seria extrair dos debates do plebiscito o que de melhor fosse para o Pará como um todo: Um Novo Pacto Político para o Pará, que viesse a enfrentar a centralização da ação de governo fundamentalmente na capital e na região metropolitana.


A evolução do Produto Interno Bruto- PIB paraense e o aumento dos investimentos em equipamentos sociais seriam uma consequência do crescimento econômico estadual, que só se viabilizará, no curto/médio prazo se o Pará se manter unido. O Pará unido poderá ter o PIB/percapta semelhante ao de São Paulo. O Pará dividido, não passará de um pobre Sergipe, sem perspectiva de ser um ator político e econômico nacional. Seriam três irmãos pobres e irrelevantes na política nacional: Pará, Carajás e Tapajós.




A distância entre o poder público e a cidade não será superada criando novas unidades federativas estaduais.

As raízes da distância entre o governo e a cidade com seus cidadãos está no desenho federativo da alocação de recursos orçamentários em direção aos municípios. No Brasil, 60% dos recursos se concentram no governo da União e tão somente 18% são destinados aos quase seis mil municípios brasileiros. Os recursos que são dirigidos aos municípios são verbas já reguladas por lei federal e são dirigidas à saúde, educação e assistência social.


A verba que mais dá sustentabilidade aos municípios da região norte e nordeste advém do Fundo de Participação dos municípios, que vem sendo destinada fundamentalmente para o pagamento de pessoal da administração direta, de terceirizados e para os custeios da máquina municipal (água, luz, telefone, aluguéis etc). Os recursos municipais advindo do imposto predial e territorial urbano- IPTU e do imposto de transmissão de bens inter vivos-ITBI são insignificantes para fazer frente às necessidades de serviços municipais.


Como consequência das dificuldades orçamentárias das regiões norte e nordeste, a região que mais se beneficia dos estados são as regiões metropolitanas, que se nutrem do centro administrativo e político e dos serviços públicos presente na capital. Os demais municípios fora desta região estratégica estão fadados a padecerem de ausência de estado. Em síntese, dentro deste desenho institucional e orçamentário do Estado brasileiro, só quem mais se beneficia dos serviços destes são as regiões metropolitanas e esta situação também se replicará para os estados de Carajás e Tapajós, caso venham a se criados.


Então os defensores da fragmentação do Pará não estão sendo sinceros com o povo que mora fora da região metropolitana de Marabá e Santarém quando prometem maravilhas com a criação dos novos estados. Por certo melhorará o asfaltamento de rodovias, por ser de interesse macro do governo e serão criados mais equipamentos sociais nas capitais, porém os municípios fora do eixo metropolitano estarão de fora destas conquistas.


Qual a solução mais viável para as regiões administrativas do Pará, inclusive de Carajás e Tapajós?

Que deste debate, a elite governante e não governante do Pará tome a inciativa de convocar as elites políticas, econômicas e a sociedade civil organizada das regiões administrativas do Pará e tracem um plano de crescimento e desenvolvimento econômico integrado e chancelado pelo poder legislativo, pelo governador do estado e pelas instituições mais representativas da sociedade civil paraense como: OAB, CNBB, Centrais Sindicais, Movimentos Populares e estudantis.

Assim, a partir de uma política de estado, saberíamos qual o investimento mínimo em infraestrutura para o desenvolvimento econômico e em equipamentos sociais que cada região administrativa do Pará teria, inclusive, antecipando os destinos futuros das emendas de bancadas parlamentares, estadual e federal. Este planejamento multi-setorial anteveria o desenvolvimento integrado do estado para três decênios. Todo este processo seria acompanhado por um conselho de desenvolvimento estadual, a ser normatizado a partir deste Novo Pacto Político Paraense. Este pacto ganharia materialidade imediata com a transferência da capital paraense para um município que se localizasse no centro geográfico do estado do Pará.


Qual o caminho institucional e político de médio e longo prazo para as regiões norte e nordeste?
No médio prazo, três objetivos seriam centrais para as regiões norte e nordeste: lutar para que,1- o novo código mineral incentive a verticalização da produção mineral, que seja taxado a exportação de produto minerais primários, 2- Que os impostos de energia sejam cobrados na fonte e não no destino, como é hoje, e 3- Que seja garantido constitucionalmente uma legislação que garanta a compensação aos estados exportadores, dos impostos perdidos com a desoneração da exportação, materializado pela Lei Kandir. Atingido estes objetivos, a ação dirigida para aproximar o governo do cidadão seria a multiplicação de municípios, viabilizados economicamente, aí sim, estaríamos aproximando o poder público da população que precisa dos serviços públicos.


No longo prazo seria a luta pela reorganização do desequilibrado pacto federativo brasileiro que, de forma invertida, vem beneficiando os estados do sul e sudeste em detrimento dos estados do norte, nordeste e centro-oeste, negando portanto, o princípio, Hobin Hood, do Estado Federativo. A partir desta conquista, o segundo passo seria a descentralização tributária rumo aos municípios brasileiros. A constituição de 1988 foi municipalista do ponto de vista político, mas não materializou esta vontade política, através de alocação tributária capaz de empoderar os municípios para fazer frente às demandas diárias por saúde, educação, assistência social, saneamento, segurança , etc.


Que fazer com a simbiose patrimonialista entre a as elites políticas federais, estaduais e os governantes municipais?
É fato comprovado no cotidiano pelas auditorias da Controladoria Geral da União de que os recursos das emendas parlamentares federais, das verbas da saúde e da merenda escolar são sistematicamente desviadas pelos governos municipais em todo o Brasil. Este fato se repete com as verbas estaduais aplicadas pelos executivos locais. A simbiose entre as elites parlamentares, burocráticas e os gestores municipais são sistematicamente reveladas nestas auditagens, tendo como consequência as seguidas operações da Polícia Federal. As verbas de saúde, educação e assistência social chegam aos cofres municipais, mas não chegam, em forma de serviços, ao cidadão/contribuinte que necessita dos serviços públicos.


Frente a estes desmandos muito comuns nos municípios brasileiros, especialmente em nosso estado, são necessárias medidas imediatas, que só a sociedade civil e a imprensa livre e cidadã podem vir a impulsionar:1- endurecimento da legislação contra o crime do colarinho branco, 2- banhimento da vida pública com a retomada dos recursos públicos apropriados pelos políticos corruptos, 3- reforma política, incluindo financiamento público de campanha eleitoral e lista fechada-flexível de candidaturas, fim das indicações políticas para os tribunais de contas e para o judiciário e garantia de um Ministério Público independente e que atue como agente de Estado e nunca seja permitido que sofram constrangimento de governos, e por último, o controle social das políticas públicas e garantia de transparência pública nos orçamentos e na aplicação de recursos públicos.


Aliado a estas medidas moralizadoras e anti-impunidade na administração publica e no controle social, é necessário uma revolução na gestão pública estadual e municipal, capaz de garantir que os gerentes públicos venham a exercer o controle republicano sobre o desempenho e a qualidade dos serviços público oferecidos ao cidadão/contribuinte.

Um comentário:

  1. Sérgio Pombo27/9/11 15:32

    Professor,com o devido respeito sou obrigado a discordar de sua análise sobre os argumentos para a emancipação de Carajás e Tapajós, pois o mais forte argumento que já se disse em prol do movimento foi a questão econômica com as vantagens que as regiões obteriam em recursos do FPE, sem prejuízo considerável ao novo Pará, e os necessários investimentos FEDERAIS para aparelhar a União nos futuros Estados membros.
    É um argumento tão poderoso que não pode ser refutado, sem sofismas, por nenhuma voz contrária à divisão.
    Outro argumento poderoso é baseado na maior representatividade política que seria obtida na Região Amazônica que está muito carente de heróis e altruoistas para influir sobre seu destino junto ao governo cental e até mesmo frente a ONGs internacionais que mandam e desmandam em nossa terra.
    Existem muitas demandas justas e honrosas para nós paraenses lutarmos, como a cobrança da construção do porto de Espadarte, em Curuçá, que diminuiria a distância percorrida em mais de 300 km de trilhos em relação ao porto do Sarney em São Luis. Que levou-nos a obra por um tremendo engodo e por falta de peso político de nossos representantes do Pará "grande".
    Esta seria uma batalha decente, e não o intento de nos perpetuarmos como uma espécie de "cafetões" ou "escavistas" do trabalho de nossos pares do sul e oeste do Pará, atando-os em um abraço como náufragos se afogando na letargia que domina nosso estado há décadas.

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