domingo, 15 de maio de 2011

A Divisão Territorial do Pará.

* Prof.Dr.Edir Veiga

Seguramente os defensores da divisão territorial do Pará, têm razões legítimas para levantar este debate e lutar para que esta aspiração se transforme em realidade. Há muito, a denúncia do abandono secular da região por parte do governo estadual, vem se repetindo pelas lideranças políticas do oeste do Pará e, mais recentemente, esse debate tem emergido com força no sul e sudeste de nosso estado.


Dentre as muitas razões levantadas, temos as queixas de ausência do governo do Pará nestas duas regiões, especialmente relacionadas à construção de infra-estrutura para o crescimento e o desenvolvimento econômico e social, tais como: a construção de portos, aeroportos, hospitais públicos de média e alta complexidade, universidades, asfalto de rodovias, saneamento básico, reforço à políticas de segurança e outras reivindicações importantes para estas regiões.


A defesa da transformação destas duas regiões em estados autônomos, foi a forma concreta encontrada por estes movimentos emancipacionistas, para fazer frente ao esquecimento político e administrativo desses espaços territoriais, por parte do Estado do Pará.


Acredito e concordo com o diagnóstico relacionado ao esquecimento das regiões oeste e sul por parte do governo estadual ao longo de nossa história. Mas pergunto, qual a região do Pará que não sofre as conseqüências históricas do investimento estadual se concentrar na região metropolitana? Qual a micro região do Pará que não precisa de investimentos estruturais do governo do Estado? Qual é a região do Pará que não padece dos mesmos problemas levantados pelos movimentos separatistas, com exceção da região metropolitana?


Todas as micro-regiões interioranas no norte e nordeste do Brasil padecem dos mesmos problemas encontrados no interior do Pará.


Isto posto, parece claro que as soluções para os graves problemas de ausência de infra-estrutura econômica e social nas regiões mais pobres do Brasil, merece uma discussão mais elaborada na busca de soluções mais apropriadas, para enfrentar este grave problema relacionado ao desequilíbrio inter-regional do crescimento econômico e social.


Não parece absolutamente claro que as regiões metropolitanas de todo o Brasil concentram o investimento governamental? Não é lógico que as sedes das empresas migrem para o centro administrativo e político do Estado e como tal atraiam a atenção do comércio, da indústria e do êxodo interiorano? Não é lógico que todo grande empreendimento industrial se transforme em pólo de atração do comércio, dos serviços e da população em busca de novas oportunidades de trabalho, a exemplo de Marabá, Santarém, Parauapebas, Tucurui, Almeirim e outras cidades pólos? Já imaginaram se toda cidade pólo virasse capital de um futuro estado?



Acredito que o abandono atávico de nosso interior, é um diagnóstico correto, o que estou duvidando é se o remédio separatista enfrentaria estruturalmente o problema de falta de investimento em bases micro regionais e municipais.


Creio, que o problema dos investimentos assimétricos que historicamente vêm se fazendo entre o sul/sudeste e o norte / nordeste do Brasil e, entre as regiões metropolitanas e as regiões interioranas, está relacionado a fatores de ordem institucional e de ordem federativa que envolvem a dinâmica de articulação entre os entes da federação brasileira.


Do ponto de vista institucional, inexistem freios e contrapesos na relação entre os poderes executivo e legislativo. Em outras palavras, o executivo tem todos os instrumentos orçamentários e políticos para tutelar o legislativo, transformando a figura do chefe do executivo em um chefe autocrático, ou seja, o povo e as regiões que compõem as unidades federativas, dependem da vontade do governador de plantão, podendo este aparelho estatal servir tanto para produzir um desenvolvimento econômico e social equilibrado, como para ser um instrumento a serviço dos projetos particularistas dos grupos que controlam o poder executivo.



Ainda falando do desenho institucional que superdimensionam o executivo, convivemos com um modelo de orçamento autorizativo, onde a decisão dos deputados em torno da peça orçamentária anual depende fundamentalmente, em última instância, da decisão do executivo, ou seja, o planejamento financeiro vira peça de ficção. Como conseqüência, os deputados para responderem afirmativamente às suas bases eleitorais, assumem um comportamento governista, têm de aderir ao executivo de plantão se quiserem que suas emendas parlamentares sejam implementadas. Com este desenho institucional da relação executivo-legislativo, as assembléias perdem sua capacidade crítica, não enfrentam as políticas conjunturalistas e pragmáticas do governo em detrimento de políticas estruturantes e de longo alcance, não propõem planos estratégicos para o Estado, como os planos decenais, que materializariam política de estado, mais do que política de governo e, como conseqüência, o estado poderia deixar de ser pensado em curto prazo.


Do ponto de vista do pacto federativo brasileiro, somos habitantes de um país onde o federalismo foi construído a partir do governo central, tendo por conseqüência, o privilégio econômico e político das regiões do sul e sudeste que galvanizaram historicamente os grandes empreendimentos industriais, tendo por conseqüência a enorme densidade demográfica destas regiões e o subseqüente peso político no congresso nacional, como resultado da concentração de eleitores que buscaram nestas regiões, melhores oportunidades no mundo do trabalho e dos negócios.



E mais, tendo o sul e o sudeste o potencial de verticalizar a produção industrial, acabam por recapturar os orçamentos públicos enviados pela união para os estados mais pobres , via exportação para os estados pouco industrializados (norte e nordeste), de bens de consumo de todas as naturezas, inclusive os bens de capitais, reproduzindo ciclicamente a pobreza nas regiões norte e nordeste do Brasil.



Em síntese, a marca do federalismo brasileiro é o desequilíbrio, onde o governo central não tem conseguido realizar o efeito Hobin Hood, ou seja, induzir o desenvolvimento econômico e social dos estados pobres através da transferência de recursos advindo dos estados mais ricos da federação, na verdade muitos dos investimentos sociais do governo federal têm se concentrado mais no eixo sul-sudeste, do que no eixo norte-nordeste. É só vermos a distribuição percapta das verbas do antigo FUNDEF, onde o estado de São Paulo recebia o equivalente a R$ 600,00 (seiscentos reais) por aluno , enquanto no norte, cada estado recebia o equivalente a R$ 300,00( trezentos reais) por aluno.


Além dos estados mais ricos da federação terem o domínio econômico e político do Estado brasileiro, a união concentra 70% dos tributos, se considerarmos as contribuições (como a CPMF, CIDE, CONFINS) que são tributos não divididos com estados e municípios. Por outro lado os municípios brasileiros só têm direito a 16% do bolo tributário nacional. Tudo isto num contexto onde a constituição de 1988 aumentou as atribuições dos municípios, sem a devida contraposição em receitas. Se quisermos garantir a presença do Estado no espaço municipal, a luta pela descentralização tributária rumo aos municípios é o caminho mais adequado a ser perseguido.



Como vemos, o problema da ausência do estado no interior do Pará e do Brasil está relacionada a problemas estruturais do desenho institucional e tributário brasileiro e necessariamente, se quisermos ver o Estado presente no espaço municipal, teremos de discutir como aumentar a arrecadação municipal e/ou, como garantir que o estado do Pará realize um planejamento e execução descentralizados de políticas públicas estruturantes no conjunto do território paraense.



Por certo, é muito difícil mudar no curto e médio prazo, o desenho institucional das relações dentro do aparelho de estado brasileiro, porém, podemos afirmar com convicção que a criação de novos entes federativos, em nada mudará essa relação de poder autoritária entre executivo e legislativo, tendo como subproduto, a tutela do executivo sobre o legislativo e a emergência de um executivo super poderoso. Os destinos das unidades federativas e do povo como um todo, ainda dependerá no curto e médio prazo, da qualidade e do compromisso de um governante.



Caso os estados do Tapajós e do Carajás vierem a ser criados, tenham certeza, a lógica do crescimento econômico concentrado na região metropolitana e em torno dos grandes empreendimentos industriais se repetirão e os cidadãos da maioria dos municípios continuarão esquecidos. Afinal, são as velhas elites conservadoras e autoritárias que se preparam para comandar estes possíveis novos entes federados.
No Pará, estamos assistindo a partir da posse do novo governo, a emergência do planejamento descentralizado pelas diversas regiões do Estado, assim como a proposta de criação de centros administrativos em Marabá e Santarém.


Este é um caminho animador para que o conjunto do Pará seja incorporado estrategicamente nos investimentos estaduais. Tenho certeza que quando o conjunto do Pará se sentir contemplado pelas políticas estruturantes do governo estadual, o debate separatista será apenas uma lembrança de um passado de abandono que deverá ser esquecido.


* Cientista Político-

3 comentários:

  1. A questão não é planejamento centralisado versus descentralisado; vide o Planejamento Territorial Participativo- versão Ana,-e o orçamento participativo -alá edimilson-
    O Estado do Pará representa aproximadamente 24% da região Amazônica. Em termos comparativos, o Pará equivale à soma dos territórios de Minas Gerais, Espírito Santo, Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná, Santa Catarina e uma parte do Rio Grande do Sul. Soma-se ao fato de que um elite corrupta e um estado ausente.

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  2. Outro ponto, como a questão ambiental esses novos Estados vão afetar a Amazônia, e alem do mais os gastos para criação das sedes, isso não leva a lugar nenhum,deixa como está, isso não passa de markentig politico!!!

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  3. Sérgio Pombo26/9/11 11:59

    Professor, parabéns pela análise que descreve a nossa metrópole como a região mais beneficiada com investimentos, tal qual como em outros Estados. Porém, acredito que devesse discorrer sobre a facilidade de acesso a esses maiores recursos da capital como hospitais, creches, PSMs,laboratórios, clínicas médicas, Universidades, laser, empregos públicos e privados, entre os moradores de Benevides, Sta. Bárbara, Castanhal e Paragominas em contraposição aos paraenses de Jacareacanga, Conceição do Araguaia, Rurópolis e Medicilândia.
    Portanto, fica fácil de entender que os paraenses do Tapajós e Carajás não usufruem de nada desses melhores recursos que nós belemenses e regiões próximas usufruímos, e esses outros paraenses possuem como metrópolis de apoio Manaus, Goiania e Araguaína e Palmas.
    Ainda, além dos fatores geográficos e culturais, essas regiões que pretendem se emancipar visam o grande incremento de investimento com recursos federais que serão direcionados via FPE e pela necessidade de criar infraestrutura da União nessas regiões, com tribunais, MP, Receita Federal, empresas públicas e economias mistas, portos, aeroportos, estradas... Tudo isto gerará emprego, renda e desenvolvimento para essas Regiões aqui na Amazônia, portanto, bastante disponível até pra nós belemenses que quisermos dispor desses benefícios morando nos novos Estados.
    Alguém, que não seja paulista tem algo contra isto?

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